Renan Ramalho, Gazeta do Povo
Não é só o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) que vem sendo investigado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Depois do término de seu mandato, com a consequente perda de poder de seu grupo político, procedimentos têm avançado rapidamente contra parlamentares aliados. Desde o fim do ano passado, deputados e senadores próximos a ele tornaram-se alvos de inquéritos e denúncias, e tendem a ser punidos, muito em razão de críticas e ofensas feitas contra os próprios ministros.
O próximo dessa leva é o deputado federal Otoni de Paula (MDB-RJ). Já está liberada para o plenário da Corte a análise de uma denúncia contra o parlamentar por difamação, injúria e coação contra o ministro Alexandre de Moraes, integrante do STF e presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Em junho de 2020, reagindo à quebra de seu sigilo bancário pelo ministro, que o investigava no inquérito dos atos antidemocráticos, o deputado disse, numa transmissão ao vivo nas redes sociais, que, com a medida, Moraes “enoja ainda mais a sociedade”.
“Eu não tenho o que temer. Não tenho o rabo preso, não sou bandido. Agora eu não sei se o sigilo bancário do ministro Alexandre de Moraes for quebrado se ele pode ter a mesma paz que eu estou tendo agora. Eu não sei se o sigilo bancário de qualquer ministro do STF for quebrado, como eles quebraram o meu sigilo agora, se eles não têm rabo preso; se eles podem mostrar o que eles ganham; se eles podem mostrar os escritórios aqui de Brasília que trabalham pra eles, e todo mundo sabe disso, ok?”, afirmou.
Para a Procuradoria-Geral da República (PGR), que fez a denúncia, Otoni de Paula teria insinuado, com essas palavras, que Moraes não agiria de forma isenta e imparcial. Teria ainda, “de forma velada”, utilizado de “violência moral” ao dizer que “pode vir quente que eu tô fervendo”. Com essa expressão, teria o intuito de “constranger futuras intervenções” de Moraes na investigação e beneficiar-se, “sob pena de retaliação”, o que configuraria o crime de coação.
A PGR acusou o parlamentar de difamação e injúria por ter chamado Moraes de “canalha”. “O senhor é tudo, menos um democrata. E o senhor não vai intimidar esse deputado. Não vai porque eu não coloquei o meu caráter no balcão de negócios. Eu não fiz do meu nome o que o senhor fez do seu”, afirmou ainda, desafiando Moras a investigá-lo.
“Não preciso ter vergonha do meu passado como você, ministro Alexandre de Moraes, tem que ter vergonha do seu passado! Não tenho amigos ligados ao PCC. Não tenho amigos ligados ao Comando Vermelho no Rio de Janeiro. Não tenho! Nunca precisei de dinheiro deles pra nada, ministro Alexandre de Moraes! Agora eu não sei se um dia o senhor já precisou ou não”, disse ainda na live. Terminou afirmando que o ministro agiria com “covardia” se determinasse uma busca em sua casa. “De forma democrática, de forma republicana, eu verei a sua queda”, disse ainda, negando que estivesse o ameaçando. Em outra live, chamou o ministro de “déspota” e “tirano”, por proibir o jornalista Oswaldo Eustáquio de usar as redes sociais.
A denúncia contra Otoni de Paula foi apresentada pela PGR ao STF uma semana depois de o próprio Alexandre de Moraes encaminhar ao órgão os vídeos com as falas do deputado. Por sorteio, ela foi enviada para a relatoria de Kassio Nunes Marques, indicado por Bolsonaro para integrar o STF. Cabe a ele o primeiro voto na análise da denúncia. Se a maioria dos ministros considerar que há indícios suficientes de crime, Otoni de Paula vira réu.
Neste mês, durante audiência pública na Câmara para discutir a imunidade parlamentar, o deputado protestou pelo fato de ser investigado por “criticar” o ministro. “Eu nunca ataquei a instituição Suprema Corte. Aliás, eu seria um louco se eu o fizesse. Porque estaria atacando a última instância da democracia em nosso país. Mas eu sempre fui crítico a ministros. O problema é que querem confundir CNPJ com CPF. O problema é que quando se critica um ministro da Suprema Corte, querem dizer que estamos a criticar, ou estamos a caluniar, ou estamos em um levante antidemocrático. Não! A Suprema Corte é maior do que seus magistrados, é maior do que os doutos ministros que ocupam temporariamente sua cadeira”, afirmou.
Outros aliados de Bolsonaro na mira do STF
Outros políticos que apoiam Bolsonaro também estão na mira. Exemplo recente foi o caso do deputado Daniel Silveira (PTB-RJ), condenado em abril do ano passado. Neste mês, o indulto concedido a ele por Bolsonaro foi derrubado e o relator, Alexandre de Moraes, mandou a Justiça executar a pena de 8 anos e 9 meses no regime fechado. Em fevereiro, ele foi preso preventivamente e assim permanecerá na cadeia.
Outro que se aproximou de Bolsonaro e já está condenado é o ex-presidente e ex-senador Fernando Collor. O processo a que responde no STF é um dos poucos que restaram da Lava Jato, já que boa parte foi anulada pela Justiça. Falta apenas os ministros definirem a pena de Collor.
Vários políticos, hoje bastante poderosos, têm conseguido se livrar dos processos da operação, como o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT); o vice Geraldo Alckmin (PSB); a presidente do PT, Gleisi Hoffmann; o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL); o senador Renan Calheiros (MDB-AL); entre vários outros.
A ação penal contra Collor, por associação criminosa, lavagem de dinheiro e corrupção na BR Distribuidora, foi julgada procedente pelo plenário do STF e ele deve começar a cumprir pena após julgamentos de recursos que podem ser apresentados à própria Corte.
Em abril, o senador Sergio Moro (União-PR) foi denunciado por calúnia contra Gilmar Mendes depois que se espalhou nas redes sociais um vídeo antigo, em que ele falava brincando, numa festa junina, em “comprar um habeas corpus” do ministro. O próprio Gilmar Mendes pediu à Procuradoria-Geral da República (PGR) para apurar o caso e, em poucos dias, o órgão ofereceu denúncia contra Moro ao STF.
Moro ainda é alvo de outra investigação na Corte, aberta pelo ministro Ricardo Lewandowski, já aposentado, por suposta extorsão contra o advogado Rodrigo Tacla Duran. Acusado de lavar dinheiro para a Odebrecht, ele acusa o ex-juiz e o deputado Deltan Dallagnol (Podemos-PR), agora cassado por decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), de cobrarem dele US$ 5 milhões para que aceitassem um acordo de delação na Lava Jato. Os dois sempre negaram e afirmam que o Ministério Público rejeitou o caso, por falta de provas.
Em 23 de maio, o ministro Alexandre de Moraes mandou a Polícia Federal investigar o deputado federal Tenente Coronel Luciano Zucco (Republicanos-RS), presidente da CPI do MST, por suposto “patrocínio e incentivo a atos antidemocráticos” no Rio Grande do Sul. No fim do ano passado, ele postou nas redes frases de apoio a manifestações em frente a quartéis militares contra a eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Outro alvo recente do STF é a deputada Carla Zambelli (PL-SP), acusada de porte ilegal de arma e constrangimento ilegal mediante grave ameaça, em decorrência do episódio em que, na véspera do segundo turno das eleições de 2022, sacou uma pistola no meio da rua e apontou para um jornalista que a teria xingado e provocado. Ainda não foi marcada data de análise da denúncia, que, se aceita, poderá tornar a parlamentar ré num processo criminal.
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