Guilherme Grandi, Gazeta do Povo
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) discursou no parlamento português, na manhã desta terça (25), sob um misto de aplausos e protestos dos parlamentares, principalmente oposicionistas, na cerimônia que relembrou a Revolução dos Cravos há 49 anos. A data é comemorada pela queda da ditadura de António Salazar em 1974 e tem um forte apelo no país.
Os protestos começaram logo nas primeiras falas de Lula, quando agradecia o convite pela visita feito pelo governo português. Um grupo de deputados oposicionistas empunhou cartazes com os dizeres “chega de corrupção” e “lugar de ladrão é na prisão”, além da bandeira da Ucrânia, para protestar contra as declarações dadas pelo presidente brasileiro de que a guerra no leste europeu teria uma responsabilidade compartilhada entre Ucrânia e Rússia.
A manifestação dos oposicionistas gerou uma repreensão do presidente da casa, Augusto Santos Silva, dizendo que os deputados que quisessem permanecer na sessão plenária deveriam “se portar com urbanidade, cortesia e educação que é exigida de qualquer representante do povo português”. No entanto, os protestos continuaram até o plenário silenciar para a retomada do discurso de Lula e se repetiram diversas vezes depois ao longo da sessão.
Em um discurso lido, sem improvisos como ocorreu durante a participação no Fórum Empresarial Portugal-Brasil na segunda (24) em que criticou a taxa de juros e a privatização de empresas brasileiras, Lula citou a revolução de 25 de abril dizendo que o movimento foi assistido pelo Brasil para, anos depois, iniciar “nossa jornada rumo à reconquista da liberdade e da democracia”, em referência à ditadura instalada em 1964 e que terminou em 1985.
“Ainda assim, a democracia no Brasil viveu recentemente momentos de grave ameaça. Saudosos do autoritarismo tentaram atrasar nosso relógio em 50 anos e reverter as liberdades que conquistamos desde a transição democrática. Os ataques foram constantes. Os irmãos portugueses assistiram a tudo, preocupados com a possibilidade de que o Brasil desse as costas ao mundo”, disse em referência aos atos de 8 de janeiro.
Ao longo do discurso, Lula repetiu falas que tem feito em muitos dos eventos por onde passa, como a "volta do Brasil" ao cenário internacional, proteção ao meio ambiente e transição energética, enfrentamento da crise climática, desenvolvimento sustentável, racismo, violência de gênero, entre outros.
Em paralelo, enquanto discursava na Assembleia da República, manifestantes faziam um protesto em Lisboa contra a presença de Lula no país. Cantando o hino português, empunhavam faixas e cartazes que mostravam os presidentes português e brasileiro se cumprimentando e a frase “tolerância zero à corrupção”, junto de bandeiras do partido oposicionista Chega, que registrou o protesto pelas redes sociais.
Manifestantes fizeram um protesto em Lisboa enquanto o ex-presidiário Lula discursava no parlamento português.| Twitter partido Chega/reprodução
Manifestantes fizeram um protesto em Lisboa enquanto Lula discursava no parlamento português.| Twitter partido Chega/reprodução
Em outro momento do discurso, Lula afirmou que o mundo “tem enfrentado múltiplas crises nas últimas duas décadas”, entre elas o “recrudescimento de ideologias extremistas, impulsionadas pela ditadura dos algoritmos”.
“Aqui na Europa, políticos demagogos que dizem não serem políticos, negam os benefícios conquistados no continente em décadas de paz, cooperação e desenvolvimento dentro da União Europeia. Eu considero a integração resultante da União Europeia um patrimônio democrático da humanidade. E eu vi no Brasil, a consequência trágica que sempre acontece quando se nega a política, se nega o diálogo”, mencionou.
“O Brasil compreende a apreensão causada pelo retorno da guerra à Europa. Condenamos a violação da integridade territorial da Ucrânia. Acreditamos em uma ordem internacional fundada no respeito ao Direito Internacional e na preservação das soberanias nacionais”, disse, citando a necessidade de diálogo e democracia.
Lula também retomou o antigo projeto de governo de fazer uma campanha pela “reforma que resulte na ampliação” do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Lula defendia um assento permanente do Brasil no colegiado que, segundo ele, “encontra-se praticamente paralisado” por não representar o atual contexto mundial daquele de quando foi criado, logo após o fim da Segunda Guerra Mundial.
Lula diz que está "empenhado" em avançar no acordo Mercosul-UE
Já ao fim do discurso no parlamento português, Lula disse que está empenhado no avanço do acordo entre o Mercosul e a União Europeia, em referência à negociação que mencionou recentemente estar nos “últimos ajustes”. E defendeu o ingresso da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa como membro-observador da Conferência Ibero-Americana.
Logo após a sessão na Assembleia da República, Lula seguiu para o Aeroporto Militar Figo Maduro para viajar a Madrid, na Espanha, onde vai se encontrar ainda nesta terça (25) com centrais sindicais e participar do encerramento do Fórum Empresarial Brasil-Espanha. Na quarta (26), terá encontros com o presidente do governo, Pedro Sánchez, e com o rei Felipe VI antes de retornar ao Brasil.
A viagem a Portugal durou cinco dias e teve a participação de 21 pessoas na comitiva presidencial. Além de Lula e da primeira-dama, viajaram também cinco ministros, três senadores, oito deputados e membros do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), da Embratur e da Apex Brasil.
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