Relação de Kassab com empresa de inspeção veicular continua turva, a despeito de recente absolvição da acusação de favorecimento
Há, sem dúvida, algo de "fantasioso" no depoimento segundo o qual o ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab (PSD) recebeu "verdadeira fortuna" da Controlar, empresa responsável pela inspeção veicular na cidade até o dia 31.
Uma testemunha, protegida pelo Ministério Público estadual, foi ouvida para dar esclarecimentos a respeito da chamada máfia do ISS (Imposto sobre Serviços), esquema de cobrança de propina em troca de alívio tributário.
Segundo seu relato, Kassab decidiu transportar para uma fazenda em Mato Grosso recursos recebidos da Controlar e até então mantidos num apartamento na capital. O volume era tamanho que, de acordo com a testemunha, o avião teve dificuldade para levantar voo.
Por meio de notas, Kassab classificou o depoimento como "falso e fantasioso", e a empresa negou de forma veemente as insinuações.
Decerto a anedota sobre problemas na decolagem ajudou o ex-prefeito a escolher o adjetivo. Ele poderia, além disso, lembrar que não há, até aqui, provas ou indícios que corroborem as declarações.
A testemunha, na verdade, nem sequer presenciou as situações descritas. Só repetiu uma história que diz ter ouvido de Ronilson Bezerra Rodrigues, subsecretário da Receita da gestão Kassab e apontado como líder da máfia do ISS.
São boas razões para manter cautela diante dessa trama, noticiada na semana passada pelo "Jornal Nacional" e pelo jornal "O Estado de S. Paulo".
Cautela, sim, mas não indiferença; o Ministério Público fez bem em abrir inquérito civil para apurar as acusações, graves o suficiente para justificar também eventual investigação criminal.
Não é novidade a existência de suspeitas quanto às relações de Kassab com a Controlar. Em 2011, o Ministério Público apontou irregularidades no contrato com a empresa, que teria obtido do então prefeito vantagens indevidas na definição da prestação do serviço de inspeção veicular.
Para os promotores, Kassab desconsiderou pareceres de órgãos municipais que eram contrários à ideia de reaproveitar, em 2007, licitação vencida pela Controlar durante a gestão de Paulo Maluf, mais de dez anos antes.
No que parece ser simples coincidência, a primeira instância da Justiça paulista, também na semana passada, absolveu Kassab e a Controlar dessas acusações.
Presume-se que recursos do Ministério Público ainda conduzirão o processo aos escaninhos dos tribunais. Ao fim e ao cabo, uma mancha preta terá sido esclarecida; será pouco, contudo, para limpar o ar paulistano, contaminado há muito tempo pela fumaça da corrupção.
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