Jornalista Andrade Junior

quinta-feira, 24 de março de 2022

'O papel da imprensa no colapso da democracia na América',

  por Flávio Gordon


“Fico surpreso em ver jornalista defendendo censura” (Jorge Pontual, jornalista de um grupo de comunicação - Globo -  hoje especializado justamente em defender censura)


A campanha eleitoral de 2020 marca o colapso definitivo da democracia na América – aquela mesma que, tendo começado no processo de independência, já estava plenamente consolidada nos anos 30 do século 19, segundo o estudo clássico de Tocqueville. Ao contrário do que já fiz em colunas anteriores (ver, por exemplo, essa e essa outra), não falo agora da alta probabilidade de Joe Biden ter sido eleito num pleito fraudulento. Falo do comportamento indecente da maioria da imprensa americana (cujo modus operandi é bovinamente reproduzido em nossas redações), que, à época, coordenou junto com as Big Techs um amplo esforço para suprimir do noticiário qualquer fato prejudicial ao candidato Democrata.

Uma das notícias escondidas ou atenuadas foi o vazamento do conteúdo de um laptop de Hunter Biden, que, entre outros materiais comprometedores (como fotos mostrando consumo de drogas pesadas), sugeria que o filho de Joe Biden praticara tráfico de influências, chegando a apresentar o pai – na época, vice-presidente dos EUA – a um consultor da Burisma, empresa ucraniana de energia para a qual Hunter trabalhava. Coincidentemente, menos de um ano depois do encontro, Joe Biden pressionava autoridades ucranianas para demitir um promotor responsável por investigar a empresa, então acusada de corrupção.

O material vazado do laptop de Hunter Biden – que havia sido esquecido por ele numa loja de reparos em Delaware, em abril de 2019 – foi apresentado pela primeira vez ao público em 14 de outubro de 2020, em reportagem exclusiva do New York Post, o jornal mais antigo dos EUA. Houve, então, uma reação espantosa do “consórcio” entre a grande imprensa e as Big Techs, que armaram uma das maiores campanhas de desinformação da história eleitoral americana.

Em lugar de repercutir a notícia e aprofundar a investigação, veículos como New York Times, CNN, NBC News, PBS, Huffington Post et caterva trataram de estigmatizar a reportagem como “fake news” a serviço de Donald Trump, e, mais especificamente, como “desinformação russa” – uma tese plantada por Natasha Bertrand, jornalista (à época do portal Politico, hoje da CNN) que atua como uma espécie de porta-voz informal da CIA. Desinformando intencionalmente, Bertrand inverteu o sentido de uma carta publicada por ex-agentes de inteligência, na qual se afirmava uma mera incerteza sobre a veracidade do conteúdo do laptop e uma falta de evidências sobre qualquer envolvimento russo.

Mas isso não importava. Sem um mínimo de comprometimento com o básico da prática jornalística, o “consórcio” midiático pró-Democrata tomou a fake news sobre “desinformação russa” como verdade consagrada, e pôs em marcha uma campanha de destruição da reputação do velho jornal nova-iorquino, fundado em 1801 pelo Founding Father Alexander Hamilton. Nesse contexto, as Big Techs perpetraram o caso mais grave de censura pré-eleitoral da história da política americana. O Twitter bloqueou a conta do New York Post, exigindo que o jornal deletasse qualquer referência à reportagem. A rede social também censurou toda e qualquer postagem feita por usuários acerca do caso. Os internautas não conseguiam sequer linkar a reportagem em conversas privadas no chat da rede social. Por meio de seu porta-voz Andy Stone, o Facebook anunciou que manipularia os algoritmos a fim de suprimir as discussões sobre a matéria, impedindo também a sua difusão com o acréscimo do famigerado selo do atual Ministério da Verdade: “esse conteúdo foi considerado desinformativo por nossa equipe independente de checagem de fatos”. Um editor do New York Post registrou o momento negativamente histórico: “Isso é um golpe de estado informacional das Big Techs. É uma guerra civil digital. Eu, na qualidade de editor de um dos maiores jornais em circulação, não posso postar uma de nossas reportagens detalhando a corrupção de um dos candidatos presidenciais em disputa”.


Fiel ao “consórcio” – que já podemos qualificar como em prol da mentira –, a imprensa brasileira, por óbvio, apenas reproduziu os ataques ao jornal, então chamado pejorativamente de “tablóide”. Em 19 de outubro, o jornal O Globo lançava dúvidas sobre a credibilidade da matéria, sugerindo que o tablóide enfrentara resistência até mesmo de seus próprios jornalistas. “Apesar de ter sido posta em xeque por praticamente todos os grandes veículos de imprensa dos EUA e ter sofrido restrições em redes sociais, o jornal reafirmou sua veracidade” – dizia a matéria do jornal carioca. Que ousadia a de contrariar a maioria dos veículos de imprensa e desobedecer aos mandamentos das Big Techs, não é mesmo?


Mas, se a reportagem ainda tentava disfarçar (posto que muito mal) sua adesão ao esforço de blindagem a Joe Biden, o jornalismo de opinião não se fez de rogado, e defendeu abertamente, sem sinal algum de rubor nas faces, a censura contra o New York Post. Foi o que fez o colunista Pedro Doria em artigo do dia 15/10/2020, no qual descrevia como “coragem” a atitude indecorosamente antidemocrática das Big Techs. “O que Facebook e Twitter fizeram quarta-feira, nos Estados Unidos, é histórico. Cercadas por críticas justas relacionadas a suas condutas em inúmeras eleições — incluindo as que levaram à presidência Donald Trump, em 2016 —, as duas plataformas agiram com incrível coragem numa decisão particularmente difícil” – opinava o colunista, apenas para concluir: “Do ponto de vista jornalístico, porém, uma decisão indubitavelmente correta. Uma decisão que também levanta o debate a respeito da fronteira entre imprensa e redes sociais”.


Eis que, como sempre, o tempo passa e a verdade recalcada ressurge. Mas, repetindo o seu comportamento de outros episódios – como o do negacionismo em face da hipótese de origem laboratorial do Sars-CoV-2 –, a imprensa agora tenta fingir que não disse o que disse e não fez o que fez (será que Pedro Doria mostrará a mão amarela?), admitindo a verdade de modo sub-reptício, sem assumir os erros e se desculpar com quem acusou levianamente de praticar “desinformação”. É o que faz o New York Times só agora, em 2022, com o seu candidato de preferência já devidamente instalado na Casa Branca. No meio de uma longa reportagem detalhando o andamento das investigações contra Hunter Biden, e quase a contragosto, lá no 24º parágrafo, o jornal insere discretamente a informação outrora proscrita: “Esses e-mails foram obtidos pelo Times de um cache de arquivos que parecem advir de um laptop abandonado pelo Sr. Biden numa loja de reparos em Delaware. Os e-mails foram autenticados por pessoas informadas da investigação”.


Apesar de longa, a matéria do NYT – que, mais uma vez, passa aquele pano todo especial nos negócios da família Biden – não diz nada de excepcional sobre o caso. Mas diz muito sobre o próprio NYT e sobre a imprensa autoproclamada “profissional” como um todo – sempre lembrando que essa imprensa “profissional” já teve por totem um sujeito como Walter Duranty, então celebrado colunista do Times e agente de propaganda stalinista, cujo prêmio Pulitzer de 1932 jamais foi revogado.


Foram precisos 17 meses, e uma eleição de todo aberrante, para que o leitor do Times tivesse conhecimento de uma ínfima fração do que o leitor do Post já sabia. E isso fez toda a diferença. Desconsiderando momentaneamente o impacto das fraudes eleitorais, o fato é que a vasta campanha de propaganda, desinformação e censura coordenada conjuntamente pelo Partido Democrata, a grande imprensa e as Big Techs influenciou decisivamente o resultado do pleito.


Foram precisos 17 meses, e uma eleição de todo aberrante, para que o leitor do Times tivesse conhecimento de uma ínfima fração do que o leitor do Post já sabia. E isso fez toda a diferença


Uma pesquisa do Media Research Center, envolvendo 1.750 eleitores em sete dos chamados swing States, sugere que um em cada 6 eleitores do Biden (17%) não teriam votado no Democrata caso soubessem de alguns dos fatos que a imprensa se recusou a noticiar em desfavor do seu candidato. Os dados mostram entre outras coisas que, na época da votação, 45,1% dos eleitores de Joe Biden não tinham conhecimento dos escândalos financeiros de Hunter, e de como os negócios do filho foram costurados sob a política externa conduzida pelo pai à época em que era vice-presidente. Se, devidamente informados por uma imprensa digna de sua função, parte desse eleitorado tivesse mudado o voto para Trump, a América e o mundo poderiam estar em situação bem distinta hoje em dia. Talvez, quiçá, em paz. Mas o serviço de inteligência e propaganda do Partido Democrata – outrora conhecido pelo nome de “imprensa” – tinha outros planos. E o resto é história.



Gazeta do Povo














publicadaemhttp://rota2014.blogspot.com/2022/03/o-papel-da-imprensa-no-colapso-da.html

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