Jornalista Andrade Junior

sábado, 31 de dezembro de 2022

'A verdade sobre o Macarthismo da Covid-19',

 por Brendan O'Neill, da Spiked


A lista negra dos dissidentes do lockdown feita pelas elites foi uma vergonha


Houve dois vírus que as autoridades quiseram conter em 2020 e 2021. O primeiro foi o vírus da covid-19. O segundo foi o vírus da dissidência. No decorrer da pandemia, especialistas se referiram ao ceticismo em relação ao lockdown e às informações erradas sobre a covid-19 como um tipo de doença, uma enfermidade contagiosa que podia infectar as mentes das massas tanto quanto a covid adoeceu os corpos. Políticos britânicos a chamaram de “pandemia da desinformação”. Precisamos proteger as pessoas tanto da “doença física quanto da doença da desinformação”, insistiram os cientistas. “Informações falsas contaminaram a reação à covid-19”, escreveu um acadêmico. Contaminar — que escolha marcante de verbo. E se ideias contrárias são uma infecção no corpo político, ficou claro qual deveria ser a cura: a censura.

Quase três anos depois do início da pandemia, ficou evidente que a censura foi uma parte central do lockdown. Nossas vidas cotidianas não foram as únicas suspensas à força — o mesmo ocorreu com o nosso direito de dizer certas coisas e até de pensar certas coisas. Nos Estados Unidos, Anthony Fauci, o diretor do Instituto Nacional de Alergias e Doenças Infecciosas, que foi incensado pela mídia liberal por sua maneira de lidar com a covid-19, foi deposto em um processo que acusa a ele e ao governo Biden de modo mais amplo de conluio com a big tech para prejudicar os direitos de expressão do povo norte-americano durante a pandemia. A ação judicial foi feita pelo procurador-geral do Missouri, Eric Schmitt. A transcrição do interrogatório de Fauci foi liberada no começo do mês. É uma leitura frustrante. Ele afirma o tempo todo não se lembrar ou não saber quando é questionado sobre seu suposto papel em reprimir a liberdade de expressão na era da covid-19. Mas parece claro que, pelo menos informalmente, ele ajudou a elaborar e impor os parâmetros do pensamento aceitável durante a pandemia.

Anthony Fauci | Foto: Reprodução

Vamos considerar a Declaração de Great Barrington (declaração redigida e assinada no Instituto Americano de Pesquisa Econômica em Great Barrington, Massachusetts, em 4 de outubro de 2020, que defendia uma abordagem alternativa à pandemia, buscando minimizar o dano social dos lockdowns). Fauci teve discussões com os altos escalões sobre como neutralizar essa carta aberta que gerou “graves preocupações com os impactos prejudiciais à saúde física e mental das políticas da covid-19 vigente”. Solicitações relacionadas à liberdade de informação mostram que as autoridades pediram a Fauci para empreender uma “derrubada rápida e implacável” da Declaração de Great Barrington. Ele não perdeu tempo. Fauci “entrou em ação para menosprezar e desacreditar a declaração”, diz um dos relatos. Isso incluiu desqualificar seus autores — Martin Kulldorff, Sunetra Gupta e Jay Bhattacharya — como “epidemiologistas menores” espalhando “bobagens”. Hoje sabemos que Bhattacharya, professor de medicina em Stanford, posteriormente foi bloqueado no Twitter e até incluído na macarthiana trends blacklist, o que significa que seus tuítes nunca chegariam aos “trending topics”. O algoritmo foi usado contra um professor herege denunciado por Fauci.

O então diretor foi diretamente responsável pelo boicote realizado pelo Twitter contra Bhattacharya? Não fica claro. Com certeza não existem provas de Fauci fazendo uma ligação para Vijaya Gadde ou qualquer outro autoritário encarregado do cenário infernal de censura do Twitter pré-Musk nem exigindo o silenciamento desse criminosos das ideias. Mas parece haver um efeito cascata político, como descreve um jornalista. Fauci emite um decreto sobre o que é verdadeiro e o que é falso em relação à covid-19, e isso logo se torna o evangelho entre os senhores da big tech — era esse o padrão. Nesse caso, ele criou uma “desqualificação sistemática” dos especialistas dissidentes do lockdown que “chegou até as redes sociais”, de modo que as ideias dessas pessoas foram rotuladas como “desinformação sobre a covid-19” e censuradas pelos moderadores de conteúdo.

Jay Bhattacharya | Foto: Wikimedia Commons

Há rastros de e-mails que sugerem uma relação mais causal entre a hostilidade de Fauci em relação às dissidências e a censura da big tech dessas mesmas dissidências. Durante o depoimento, foram mostrados a ele e-mails que sugerem que seus próprios funcionários tentaram entrar em contato com o Google para dar início a uma conversa sobre a “desinformação” relacionada à vacina contra a covid-19. Pouco tempo depois, as redes sociais começaram a adicionar advertências em posts sobre a vacina e até suspenderam algumas contas por divulgarem “desinformação” sobre imunizantes. Se essas coisas estiverem conectadas, é uma grande coisa, porque autoridades nos Estados Unidos são proibidas pela Primeira Emenda de restringir os direitos de expressão de seus cidadãos. Se o governo sob Joe Biden terceirizou a censura para empresas concordantes, mesmo assim é censura de Estado.

Fauci emite um decreto sobre o que é verdadeiro e o que é falso em relação à covid-19, e isso logo se torna o evangelho entre os senhores da big tech — era esse o padrão

De certa forma, o fato de que parece não ter havido nenhuma necessidade de uma cadeia de comando direta entre a administração Biden e a big tech para que a censura da covid-19 ocorresse é ainda mais assustador. E confirma que o conformismo em relação à doença se generalizou no establishment, e como é natural para as oligarquias do Vale do Silício fazer as vontades das elites democráticas. O consenso da elite é uma fera poderosa. Mais uma vez, a opinião do governo sobre a covid-19 se tornou a única opinião exprimível na praça pública digital.

Então, quando o governo se posicionou a favor das máscaras, a dissidência em relação a elas foi implacavelmente censurada: veja a proibição do YouTube de um vídeo que traz o senador Rand Paul questionando sua eficácia. Quando as autoridades insistiram que o lockdown era a única maneira de lidar com a covid, toda a intelectualidade que se manifestou contra o lockdown correu o risco de ser banida, como os autores da Declaração de Great Barrington, e outros descobriram. E quando Fauci acreditou que a teoria do vazamento de laboratório era uma teoria da conspiração ridícula, “todas as opiniões conflitantes” correram o risco de ser censuradas on-line. Surpreendentemente, foi só quando o governo Biden afirmou, em maio do ano passado, que iria investigar essa teoria que o Facebook finalmente removeu a censura em relação a ela — prova de que a visão do governo reinou suprema nas redes sociais durante a pandemia.

Censura global

Precisamos falar sobre isso. Vivemos em sociedades supostamente livres e, mesmo assim, qualquer um que discordasse da opinião do Estado sobre a covid-19 correu o risco de ir parar numa lista negra e ser silenciado. Meio que não importa se Fauci “estava em conluio” com a big tech. Isso significa que de fato foi muito difícil para os cidadãos em um dos poucos espaços públicos que podiam ser acessados livremente durante a pandemia — a internet — discordarem a opinião do governo. Pior ainda, houve um elemento neoimperial nessa supressão on-line dos desvios dos ditames de Fauci. As empresas de rede social globalizaram a visão dos Estados Unidos sobre a covid-19 de modo que até as pobres almas em Londres, Paris ou Melbourne foram suspensas — banidas da praça pública — por fazer um comentário que o reverendo Anthony Fauci poderia desaprovar.

Matt Hancock, em 2021 | Foto: Shutterstock

No Reino Unido, onde não existe a Primeira Emenda da Constituição Americana, a ligação entre o Estado e a censura das redes sociais ficou muito mais clara. Hoje se sabe que Matt Hancock, secretário de Saúde durante a pandemia, entrou em contato diretamente com os chefes da big tech e pressionou para que eles eliminassem a “desinformação”. Em janeiro de 2020, seu consultor especial estava em conversa com o Twitter sobre “afinar os algoritmos”. Hancock também mandou “mensagens de texto pessoalmente” para Nick Clegg, antigo líder do partido Liberais Democratas, que na época era vice-presidente de assuntos globais do Facebook, para encorajá-lo a controlar a discussão on-line. Nas palavras de Isabel Oakeshott, Clegg ficou “feliz em ajudar”. Hancock queria que Clegg silenciasse comentários antivacina em especial. Em julho de 2020, histericamente, um membro do Parlamento britânico chamou os ataques à vacina como “uma bomba ideológica pronta para explodir”. É assim que os nossos governantes enxergam o livre fluxo de ideias — como um perigo de nível nuclear, com chance de matar ou infectar aos milhares.

O caso de amor Hancock-Clegg sobre a supressão de algumas ideias relacionadas à covid-19 mostra como a oligarquia é incestuosa. Vimos um político com mandato papeando com um antigo político sobre usar seu poder extraordinário de supervisor de uma conversa global para escantear algumas vozes. Tudo isso aconteceu para além do universo da responsabilização democrática, para além até do universo do Estado.

Em vez disso, um funcionário público conspirou com o funcionário de uma empresa privada para conter o que milhões podiam ver e ouvir on-line. Não havia necessidade de que uma lei contivesse os dissidentes, a opinião do Estado sobre todas as coisas ligadas à covid-19 foi imposta de forma casual e informal em todos os dispositivos que possuímos, graças a um político em que votamos para tirar do cargo cinco anos atrás. É sinistro.

Claro, não foi apenas o discurso on-line que foi controlado. O mesmo aconteceu com o direito de protestar. Como Oakeshott nos fez lembrar, “protestos antilockdown foram rapidamente proibidos” em 2020. Em setembro do mesmo ano, o Gabinete Britânico sugeriu que os protestos deveriam ser dispensados da “regra de seis”, que proibia qualquer reunião externa de mais de seis pessoas, mas Hancock chamou o parlamentar britânico Michael Gove para “acabar com isso”. E “Gove não viu nenhum problema em ajudar”. Então fomos impedidos de nos manifestar livremente on-line e impedidos de exercer nosso direito de discordar em público. Foi a repressão à liberdade política mais séria que o Ocidente vivenciou em muito tempo.

Milhares de pessoas se reúnem no Lincoln Memorial para protestar contra as vacinas, em Washington, DC, EUA, 23/1/2022 | Foto: Shutterstock

Vai levar um bom tempo para que possamos medir o impacto desse império de censura da covid-19 nas nossas sociedades. Para mim, ele não só proibiu a expressão de algumas opiniões, o que é uma infração bastante grave em si — possivelmente a infração mais grave que uma sociedade pode cometer —, mas também nos deixou catastroficamente despreparados para a era pós-lockdown.

A punição dos dissidentes que se perguntaram em voz alta se o lockdown poderia levar a um acúmulo mortal no sistema de saúde, a um declínio na saúde mental das pessoas, a uma regressão nas habilidades sociais das crianças e a uma crise econômica que pode ter consequências muito negativas significa que nunca conversamos de fato sobre essas questões.

Temos uma lição aqui: a censura é uma força incrivelmente destrutiva. A supressão das dissidências é sempre uma má ideia, em qualquer situação. Ela reduz a capacidade que uma sociedade tem de explorar ângulos, examinar possibilidades e imaginar cenários futuros. Nunca mais podemos permitir que especialistas excluam o que quer que considerem ser uma ideia anticientífica ou perigosa. Em todas as questões: de pandemias à economia, passando pelo clima, a liberdade de pensar, falar e alertar deve prevalecer.


Brendan O’Neill é repórter-chefe de política da Spiked e apresentador do podcast da Spiked, The Brendan O’Neill Show.
Ele está no Instagram: @burntoakboy


Revista Oeste










publicadaemhttp://rota2014.blogspot.com/2022/12/a-verdade-sobre-o-macarthismo-da-covid.html

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