Jornalista Andrade Junior

domingo, 7 de outubro de 2018

"O inverno petista - A eleição de Haddad equivaleria a um prêmio à desfaçatez do PT, que patrocinou uma enorme crise moral, política e econômica — e nem pediu desculpas ao país"

Por Daniel Pereira, Veja

 Candidato do PT à Presidência, Fernando Haddad já colheu o bônus e o ônus decorrentes de sua ligação umbilical com o ex-presidente Lula. Em meados de setembro, saltou 11 pontos porcentuais em apenas sete dias, de acordo com o Ibope, consolidando-­se na segunda posição na corrida eleitoral. Na semana passada, sua rejeição disparou 9 pontos, de acordo com o Datafolha, o que o colocou no pelotão dos mais rejeitados, junto com Jair Bolsonaro. A razão da gangorra não é complexa: o lulismo é hospedeiro do antipetismo. O crescimento de um tem como consequência o fortalecimento do outro. E isso porque o PT é o responsável direto e inequívoco pela monumental crise moral, política e econômica que o Brasil atravessa — e sua volta ao poder seria um prêmio ao retrocesso.
Haddad tem suas qualidades pessoais. Apontado como um político moderado — “o mais tucano dos petistas”, diz o bordão —, ele formou-se em direito pela Universidade de São Paulo (USP), onde fez mestrado em economia e doutorado em filosofia, e teve a experiência de comandar a maior cidade do país — da qual saiu, no entanto, com popularidade abaixo de 15%, o pior índice em uma década e meia.
Mas o grande problema de Haddad é o que vem junto com ele. Além de ser o preposto de um presidiário, Had­dad traz consigo a soberba do PT, que patrocinou um desastre ético e econômico e, até o dia de hoje, foi incapaz de fazer qualquer autocrítica, o que autoriza os brasileiros a supor que, numa eventual volta ao poder, tudo pode se repetir. E a definição do que é “tudo” está nas palavras inesquecíveis do ministro Celso de Mello, no julgamento do mensalão, quando ainda não se conhecia o petrolão: “São homens que desconhecem a República, que ultrajaram as suas instituições e que, atraídos por uma perversa vocação para o controle criminoso do poder, vilipendiaram os signos do Estado democrático de direito”.
São homens que desconhecem a República, que ultrajaram as suas instituições e que, atraídos por uma perversa vocação para o controle criminoso do poder, vilipendiaram os signos do Estado democrático de direito.
Celso de Mello, ministro do STF, no julgamento do mensalão
Na segunda-feira, o juiz Sergio Moro deu uma forcinha para que os eleitores não se esquecessem de nada disso. A seis dias da eleição, ele quebrou o sigilo de parte da delação do ex-ministro Antonio Palocci, que estava em seu poder desde junho. No trecho divulgado, Palocci diz que Lula sabia das traficâncias na Petrobras desde 2007 e orientou os companheiros a usar a exploração do pré-sal para levantar dinheiro sujo a fim de financiar o projeto de poder do partido. Segundo ele, as campanhas presidenciais de Dilma em 2010 e 2014 custaram juntas 1,4 bilhão de reais, quase três vezes mais que o valor declarado à Justiça Eleitoral.
Haddad não se envolveu nessa lama específica, mas, como seus colegas de sigla, recusa-se a fazer qualquer mea-culpa e declara que Lula foi preso injustamente. De forma protocolar, costuma repetir que quem errou deve pagar por seus erros, como se os escândalos fossem produto de deslizes pessoais. Não foram. O PT funcionou como uma “organização criminosa”, segundo denúncia apresentada à Justiça pela Procuradoria-Geral da República. O partido, que critica o desapreço de Bolsonaro pela democracia, também solapou as bases democráticas com o mensalão e o petrolão. Ex-chefe da Casa Civil de Lula, José Dirceu foi preso num escândalo e voltou para a cadeia no outro. Numa entrevista recente, afirmou que seria “uma questão de tempo pra gente tomar o poder”. Haddad teve de dizer que, num eventual governo seu, Dirceu “não terá nenhum papel”. Será?

Haddad parece não partilhar de posições extremadas, mas talvez seja o ápice da ingenuidade imaginar que, eleito, ele seria capaz de conter seus radicais. Na campanha, o ex-prefeito tenta equilibrar-se numa linha de ambiguidade. Enquanto a direção do PT presta solidariedade ao regime “democrático” venezuelano, ele permite-se apenas dizer que o país vizinho não vive uma situação de “normalidade”. Recentemente, afirmou que, se eleito, criará condições para a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte destinada a aprovar reformas. É um ardil, do qual o próprio Haddad parece discordar, mas que é obrigado a defender. Mau sinal. O balão de ensaio encontrou paralelo na campanha de Bolsonaro, cujo vice, o general Hamilton Mourão, propôs a convocação de uma comissão de notáveis para reformar a Constituição.
 Ex-ministro da Educação e ex-prefeito de São Paulo, Haddad nunca participou ativamente da vida partidária do PT, o que provoca choques constantes entre o que ele pensa e o que o partido determina que ele faça. Recentemente, o candidato desautorizou publicamente um de seus conselheiros econômicos, para quem a reforma da Previdência não é urgente. Além disso, rechaçou a ideia do seu próprio programa de governo segundo a qual o Banco Central deve perseguir não só a meta de inflação mas também uma meta de geração de emprego.
No programa de governo do candidato, estão todos os pilares do pensamento petista: revogação da emenda do teto de gastos públicos e da reforma trabalhista e “recuperação do pré-sal”, cuja exploração, segundo a delação de Palocci, foi pensada como forma de financiar as campanhas do partido. Sem entrar em detalhes, o plano também fala em usar os bancos públicos para promover o desenvolvimento regional — o que pode ser uma boa ideia mas evoca pesadelos. Nos governos do PT, as arcas do BNDES bancaram a política de campeãs nacionais, como a JBS e a Odebrecht, que devolviam o agrado na forma de propinas milionárias.
A volta do PT ao poder traz uma ameaça de vingança contra setores que, a seu ver, são “golpistas”, como a imprensa, o Ministério Público e o Judiciário, que tiveram papel relevante na descoberta das roubalheiras petistas. Além da proposta de retirar os poderes do Ministério Público feita por José Dirceu, o partido pretende implantar o que chama de “controle social da mídia” — o que pode ser visto como um eufemismo para definir censura. Isolado politicamente desde o impeachment de Dilma Rousseff, o PT também já tem pronta uma estratégia para se viabilizar num eventual segundo turno e para garantir uma futura governabilidade. Lula aconselhou Haddad a manter as portas abertas para alianças com o MDB e o Centrão — os expoentes de sempre do fisiologismo, os velhos parceiros do PT nos esquemas de corrupção. De sua cela em Curitiba, Lula continua dando as cartas. A vitória de Haddad será a vitória do ex-­presidente. Haddad jura que não concederá indulto a Lula, mas prometeu empregar todas as formas jurídicas possíveis para livrá-lo da prisão. Para onde quer que se olhe, o cenário parece remontar a tragédia que o país já conheceu e da qual está sofrendo para sair.










extraídaderota2014blogspot

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