Jornalista Andrade Junior

segunda-feira, 10 de novembro de 2025

Antissemitismo marxista

 Valdemar Munaro


    A Questão Judaica', de Karl Marx (1818 – 1883), originalmente publicada nos Anais Franco-Alemães de 1844, é a mais antissemita obra do século XIX. A lógica de seu raciocínio e o raciocínio de sua lógica são um prelúdio do nazismo efetivado no século XX. O escrito, criminoso e demencial, é um registro da intelectual degradação iluminista que a filosofia hegeliana e materialista 'conquistou'.

Muitos autores da época eram antissemitas, entre eles, poetas e filósofos: I. Kant, G. W. Hegel, Johann Fichte, Ferdinand LaSalle, F. Holderlin, K. Marx, F. Engels, Bruno Bauer, A. Schopenhauer, Frederico Nietzsche, Pierre J. Proudhon, Richard Wagner etc. Todos contribuíram para aumentar e espalhar, com vigor, o antissemitismo.

Marx tinha ciência dos pogroms do seu tempo, da miserável vida das comunidades judaicas espalhadas pela Europa oriental e ocidental, desde Portugal, Espanha, França, Polônia, Hungria, Áustria, Rússia até chegar à Alemanha prussiana, sua terra natal. Em todos esses países e em outros mais, havia hostilidade aberta a judeus, restrição a empregos públicos, proibição de sinagogas, impedimentos ao serviço militar, leis contrárias à posse de terras, trancos à abertura de negócios e comércios específicos, impostos adicionais a aldeias etc.

O quadro era desolador para a maioria dos hebreus que vivia na Europa do século XVIII e XIX. Mas apesar do conhecimento de todos aqueles fatos e circunstâncias, Marx manteve sua ideia estereotipada e preconceituosa contra os judeus, extravasando-a em julgamentos e insultos inexplicáveis.

Seus bajuladores justificam o escrito de Marx atribuindo-o a uma 'crise' pessoal, um posicionamento juvenil e intelectual ainda não plenamente 'marxista'. Ora, a justificativa é fajuta, pois Marx jamais se retratou, guardando um silêncio sepulcral sobre o assunto e se mantendo incólume, até o fim, no seu antissemitismo.

O ódio aos judeus, tentam explicar seus defensores, resultou do ódio de Marx por si mesmo. Transmutado em ressentimento expresso, Marx faria de seu antissemitismo uma espécie de catarse terapêutica pessoal. Permanece, porém, inexplicável a contradição do proclamado defensor dos oprimidos, que, ao mesmo tempo, os ataca e os quer destruir. O marxismo, de matriz essencialmente hegeliana, consegue a cara de pau de não se envergonhar das próprias contradições e hipocrisias.

Karl Marx, dizem ainda seus simpatizantes, vociferou contra os judeus porque tinha um objetivo: obter a adesão e a admiração de seu público-alvo, o operariado. Para chegar à tal conquista, não se importou com o apodrecimento da alma; queria a todo custo convencer seus interlocutores de que era um homem autenticamente irreligioso, materialista e ateu.

Embora fossem judeus, os Marx não prezavam os valores religiosos, muito menos as histórias bíblicas e as tradições cristãs. Foram as conveniências empregatícias que levaram seu pai, Hirschel, e sua mãe, Henriette, mentirosamente, a se converter ao luteranismo.

Nos anos 1817, 1824 e 1825, Hirschel, Karl e Henriette, respectivamente, batizaram-se na igreja protestante, o que lhes permitiu a continuação do soldo mensal correspondente ao exercício advocatício em Treveris. Hirschel passou a se chamar Heinrich, enquanto sua mulher, Karl e as demais crianças continuaram com os mesmos nomes.

A conversão farsesca tornou-se um espinho incomodativo na vida de Marx. Desejava não ter sido judeu e menos ainda ter recebido o batismo cristão. O forçoso judaísmo protestante converteu-se em chaga purulenta e culposa da qual sua alma ateia queria se expurgar.

Mas 'A Questão Judaica', em parte, também contrastava a tese do parceiro Bruno Bauer (1809 – 1882), um socialista hegeliano, preconceituoso e antissemita, metido a teólogo, cuja análise sobre o hebreu, historicamente real, terminava por considerá-lo um ser desprezível e incapaz. Segundo Bruno Bauer, os hebreus herdaram uma esperança messiânica que se personificou na imaginária terra prometida. Nunca, porém, puderam alcançá-la em razão de sua inaptidão e incapacidade.

Então, conforme Bauer, sendo essencialmente incapazes, os judeus se tornaram culpados da sua própria opressão e do próprio destino repleto de sofrimentos. A causa, pois, da miserável condição na qual o judeu se meteu está no seio do próprio judaísmo. A opressão do judeu se deve à sua teimosia em se manter judeu. Sua opressão, portanto, é seu judaísmo e seu judaísmo é sua opressão. O judeu, segundo Bauer, tem uma grande maldição: ser judeu. Por consequência, não há, para ele, outra saída, senão deixar de ser o que é.

Como se observa, o antissemitismo proposto por Bauer aumenta sobremaneira o problema judaico e o deixa sem alternativas. Para resolvê-lo, segundo Bauer, o judeu deve não existir. Se o problema está na sua religião e a religião está no seu problema, então o judaísmo deve ser suprimido.

Do ponto de vista da factualidade história, não se pode negar a discriminação e a marginalização sofridas pelo povo judeu ao longo do tempo, mas as perseguições, segundo Bauer, encontrariam solução num hipotético sionismo cujo lugar geográfico permitiria ao judeu exercer sua nacionalidade e sua cultura. Porém, como o judeu, no entender de Bauer, é um incapacitado, melhor seria que desaparecesse.

O antissemitismo abjeto e asqueroso de Bauer, entretanto, é menos grave que o de K. Marx. As páginas de 'A Questão Judaica' deste último, mostram uma cegueira proposital e criminosa que não vê os fatos históricos incontestáveis, mas escreve sobre o que preconceituosamente pensa. Não há no texto um rastro de lucidez, decência e honestidade. Há, sim, ao invés, um dogmatismo abjeto típico de um pensador vigarista e inescrupuloso.

Segundo Marx, não devemos nos preocupar em encontrar soluções para o problema judaico. Devemos, antes, nos libertar dele. A sociedade deve se emancipar do judaísmo. É a humanidade que deve se libertar do judaísmo e não o contrário. "Nós buscamos, diz Marx, o segredo do hebreu não na sua religião, mas buscamos o segredo da religião no hebreu real. Qual é o fundamento mundano do judaísmo? A necessidade prática, o egoísmo. Qual o culto mundano do hebreu? O tráfico. Qual o seu Deus mundano? O dinheiro. Pois bem. A emancipação do tráfico e do dinheiro, do judaísmo prático portanto, real, seria a autoemancipação do nosso tempo".

O raciocínio sofístico de Karl Marx segue a seguinte lógica: 1) o judaísmo é o dinheiro. 2) O dinheiro é a burguesia. 3) A burguesia deve ser destruída. Portanto, é preciso suprimir ou destruir o judaísmo.

"Em tal modo, dogmatizando, diz o comentador Robert Misrahi, Marx passa da acusação popular, 'os hebreus são por essência avaros', à acusação pseudocientífica 'os hebreus são, por essência, a própria burguesia'. O recíproco é, segundo Marx, também verdadeiro, e, se o judaísmo (dado que é a potência financeira mundial) é a burguesia, inversamente a burguesia é o judaísmo: 'o hebreu, que está na sociedade civil (burguesa) como membro particular, é só a manifestação particular do judaísmo da sociedade civil (da burguesia)'."

Como se vê, continua ainda Robert Misrahi, a situação para o hebreu é praticamente desesperadora: se se afirmar que todos os hebreus são burgueses, o judaísmo deve ser combatido no seu complexo e pela sua imediata culpabilidade, mas se se reconhece que existem burgueses não hebreus, igualmente se afirma a culpabilidade do judaísmo porque os burgueses são a realização do judaísmo e porque os hebreus, enquanto tais, exprimem o que há de judaico na burguesia... O mundo se judaizou, e todos os sofrimentos e os conflitos deste mundo provêm do fato que são praticamente judaicos. Estamos diante da forma extrema de delírio antissemita: o mal do mundo é o judaísmo no mundo, e o mundo como judaísmo".

Em outras palavras, Marx afirma que, de todos os modos, os judeus são culpados pelos males do mundo, tanto por serem burgueses, quanto por serem judeus. O judaísmo, segundo Marx, é a causa de todas as alienações, por isso, deve ser exterminado. A natureza hebraica, intrinsecamente má, faz do judeu um ser sem direitos à emancipação e à vida. Devemos, pois, batalhar pela emancipação da sociedade, libertando-a do judaísmo e de seu desdobramento, o cristianismo. É a sociedade humana que deve se libertar dos judeus e, por consequência, dos cristãos, e não o inverso.

Se as considerações antissemitas de Bauer reservavam ainda alguma pálida ideia sionista para resolver o problema judaico, um confinamento em algum lugar do mundo para os hebreus, Marx, ao invés, propõe seu radical e completo extermínio.

Segundo suas palavras, "apenas a sociedade suprima a essência empírica do judaísmo, o tráfico e os seus pressupostos, o hebreu se tornará impossível, porque a sua consciência não terá mais algum objeto, porque a base subjetiva do judaísmo, a necessidade prática se humanizará, porque será abolido o conflito da existência individual sensível com a existência do homem como espécie. A emancipação social do hebreu é a emancipação da sociedade do judaísmo."

Se o judaísmo é a causa dos males da humanidade, a solução está na sua erradicação. Marx revela aqui sua patologia maniqueísta que se outorga a si mesmo a monstruosa tarefa de julgar definitivamente os que devem ou não viver no mundo do qual não é autor.

Como se vê, o antissemitismo marxista é violento e criminoso. É inconcebível e inexplicável observar a travessura de muitos judeus marxistas indo atrás de uma doutrina que os matará. Da mesma forma, é inconcebível e desolador ver cristãos seduzindo pela mesma filosofia, cujos princípios, nutrem ódio ao judaísmo e desprezo visceral à religião de Jesus.

Marx insultava Moses Hess chamando-o de rabino e Ferdinand Lassalle de negro. Ambos eram alemães, socialistas e colegas pensadores de semelhante perfil. Hess não era rabino e Lassalle não era negro, mas Marx era racista.

O ódio aos judeus se tornou, tristemente, um combustível a diversas mobilidades políticas e sociais. Se porventura, um dia ele vier a se extinguir, veremos como hão de se extinguir também, automaticamente, os interesses por Gaza, o amor aos palestinos, as flotilhas solidárias, as lutas Lgbt, as batalhas feministas, etc. Marx não inventou a hipocrisia e a mentira, mas ensinou magistralmente como 'bem utilizá-las'.









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