por Samuel Pessôa FOLHA DE SÃO PAULO
Do ponto de vista econômico, não me parece que o impeachment da presidente seja um bom caminho.
Tínhamos no fim do ano passado três inconsistências: um regime
desastroso de política econômica, que produziu forte desaceleração na
atividade e a construção de desequilíbrios (inflacionário, externo e das
contas públicas); o esgotamento de um contrato social que requer
crescimento contínuo do gasto público além do crescimento da economia; a
necessidade de nova rodada de medidas com vistas a elevar a eficiência
da economia e estimular o crescimento, como a reforma dos impostos
indiretos para reduzir o custo de observância da legislação tributária.
O ministro Levy abordou o primeiro item dessa pauta, pois encontra-se sob sua jurisdição. O resto depende do Congresso Nacional.
O impedimento da presidente Dilma não irá fazer aparecer 3% do PIB de
superavit primário, não produzirá uma reforma previdenciária que
mantenha o crescimento do gasto público nos limites dados pelo
crescimento do produto nem criará as condições políticas para a
aprovação das reformas estruturais necessárias à retomada do
crescimento.
O exemplo exitoso do mandato tampão de Itamar sugere que podemos repetir a aposta. Sou cético.
O motivo de meu ceticismo é que os dilemas atuais apresentam economia
política muito mais complexa do que a estabilização econômica. A
complexidade do Plano Real era mais técnica do que política, apesar de
os desafios de construção de consensos políticos serem sempre imensos,
dadas as características de nossa sociedade e de nossas instituições
políticas.
Parece-me, portanto, que dificilmente Temer ou quem quer que venha
ocupar aquela cadeira terá as condições de tocar o governo. A campanha
eleitoral, que somente discutiu legados, retira hoje legitimidade de
qualquer governo.
A melhor saída que há à manutenção da presidente zumbi por mais três
anos seria renúncia de toda a chapa, da presidente e do vice, para que
um novo processo eleitoral fosse convocado e os partidos apresentassem
candidaturas.
Um processo eleitoral competitivo, em que os partidos conversassem
abertamente com a sociedade sobre nossos dilemas, dificuldades e
possíveis caminhos, poderia pavimentar a construção de consensos
políticos para viabilizar saídas para as duas inconsistências que
impedem, mesmo após completarmos o ajustamento cíclico, a retomada do
crescimento.
Essa saída, porém, teria que derivar de ato voluntário da atual chapa no poder, e não a ela imposto.
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